18/07/2016
Com a aprovação do PLC nº 07/2016, conflito será gerado na Lei Maria da Penha, já que abre um precedente para que a autoridade policial aplique as Medidas que só ao juiz cabe decidir.
Escrito por: Flora Maria Brito Pereira - Advogada (OAB 17967/BA)
Entenda a proposta de alteração
Em agosto de 2016, a Lei 11.340/2006 – LEI MARIA DA PENHA – completará 10 anos no Ordenamento Jurídico Brasileiro e está prestes a ser alterada pelo Projeto de Lei da Câmara nº 07/2016 que tramita no Senado Federal visando acrescentar dispositivos para dispor sobre o direito da vítima de violência doméstica de ter atendimento policial e pericial especializado, ininterrupto e prestado, preferencialmente, por servidores do sexo feminino; dentre outras providências.
Esse Projeto de Lei vem sendo duramente criticado, merecendo uma análise aprofundada do que essas mudanças representam para a aplicação da referida Lei.
O artigo 10º, § 1º apresenta alguns incisos com as disposições para a inquirição da vítima ou da testemunha de violência doméstica; merecendo destaque o inciso II disciplinando que deverá ser garantido que em nenhuma hipótese a vítima de violência doméstica, familiares e testemunhas tenham contato direto com investigados ou suspeitos e pessoas a eles relacionados. A Lei Maria da Penha veda explicitamente no artigo 41 a aplicação da Lei 9.099/95 no que tange aos crimes relacionados com violência doméstica e familiar, devendo haver a instauração de Inquérito Policial.
No desenvolvimento do Inquérito Policial poderá ser necessário realizar acareações entre os envolvidos para elucidar contradições. Se aplicado o artigo conforme acima descrito o Inquérito Policial poderá ficar seivado de vício prejudicial ao andamento regular do processo, sendo determinado seu retorno à autoridade policial para complementação; ou poderá ser determinado o seu arquivamento, causando um aumento na sensação de impunidade dos crimes referentes à violência doméstica.
O PLC prevê que os Estados e o Distrito Federal dêem prioridade à criação de Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher - DEAMs, de Núcleos Investigativos de Feminicídio e de equipes especializadas para o atendimento e investigação das violências graves contra a mulher, sem prever de onde sairão os recursos orçamentários necessários à implementação desses serviços, atribuindo aos Estados e ao Distrito Federal uma responsabilidade orçamentária não estimada com a realização de concursos públicos para a contratação de servidoras, construção e adequação dos espaços de atendimento, capacitação de servidoras e servidores que atuam nestes serviços, aquisição de equipamentos que possibilitem a gravação dos depoimentos.
Cabe registrar que o artigo 12-B é o mais polêmico, pois possibilitará à autoridade policial aplicar provisoriamente as Medidas Protetivas de Urgência. A Lei nº 11.340/2006 disciplina no artigo 18 que caberá ao juiz decidir sobre as Medidas Protetivas de Urgência. Sendo o PLC nº 07/2016 aprovado, gerará um nítido conflito na Lei Maria da Penha, já que abre um precedente para que a autoridade policial aplique as Medidas que só ao juiz cabe decidir.
Ademais, não fica estabelecido no PLC quem fará a entrega ao agressor do documento que deferiu a Medida, nem discriminado que tipo de documento seria esse. Além do que o expediente terá que ser encaminhado ao juiz num prazo de 24 horas para que decida no mesmo prazo, ouvido o Ministério Público. As medidas cautelares, por serem medidas de urgência não exigem a oitiva do Ministério Público num primeiro momento, podendo ser expedidas pelo juiz de imediato. Não ficou definido se o prazo de 24 horas é para a decisão judicial com a oitiva do Ministério Público ou só para a oitiva do Parquet. Se a interpretação for de que o prazo de 24 horas é para a manifestação do Ministério Público, significa que o/a juiz/juíza não terá mais prazo definido para decidir sobre a Medida.
O artigo 12-B sob análise gera insegurança jurídica já que o/a juiz/juíza poderá entender que não cabe a Medida Protetiva de Urgência aplicada pela autoridade policial, dando margem ao descrédito das mulheres no que tange a aplicação da Lei Maria da Penha. Além de eximir a justiça de uma melhor prestação jurisdicional com a implantação de novas Varas de violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, de capacitação de seus/suas servidores/as, de realização de concurso público e mais agilidade nas decisões judiciais.
Um dos argumentos favoráveis dos/as defensores/as do artigo 12-B é a agilidade que teria o deferimento das Medidas Protetivas, pois em alguns Estados o deferimento tem demorado muito mais do que as 48horas determinadas pela Lei 11.340/2006. Argumento este que é prontamente derrubado no §1º, já que o/a juiz/juízadeverá decidir sobre a aplicação da Medida em um prazo muito menor do estabelecido na Lei Maria da Penha; existindo a partir da promulgação do PLC nº 07/2016 dois prazos a serem obedecidos: o prazo para decisão das MPU requeridas pelo Ministério Público ou pela ofendida e das deferidas provisoriamente pela autoridade policial.
O PLC nº 07/2016 vem na contramão do anseio do movimento de mulheres, tramita sem ouvir o referido movimento, os Órgãos e Entidades que atuam contra a violência contra a mulher e se aprovado irá trazer sérios danos à efetivação da Lei Maria da Penha comprometendo a aplicação de uma das melhores leis no que tange ao enfrentamento da violência contra a mulher.
Artigo de: Flora Maria Brito Pereira - Advogada, especialista em Gestão de Políticas Públicas em Gênero e Raça (OAB 17967/BA)
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